Audiência pública: "O salário [dos militares] .
28 de fevereiro de 2014
Audiência pública: "O salário [dos militares] não paga o aluguel de uma simples morada na periferia de Brasília", diz senador.
Publicado originalmente as 22 horas de 27/2
Em debate, militares e parentes manifestam insatisfação com salários e benefícios
Em debate, militares e parentes manifestam insatisfação com salários e benefícios
Senador Paulo Paim e Kelma Costa durante a audiência pública |
Gorette Brandão
Durante audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação
Participativa (CDH), nesta quinta-feira (27), militares da reserva e
familiares de integrantes das Forças Armadas ainda na ativa falaram das
insatisfações com os baixos salários e os benefícios da carreira.
Os militares cobram, entre outros pontos, o pagamento de um reajuste
salarial de 28% ainda pendente em relação a diversos subgrupos,
referente ao antigo sistema de reajuste na data-base do período
inflacionário. Seria uma dívida salarial já reconhecida pela Justiça, da
ordem de R$ 5 bilhões. Houve ainda apelos pela correção de
discrepâncias de tratamento entre servidores situados no mesmo grau
hierárquico.
O senador Paulo Paim (PT-RS), que pediu a audiência e dirigiu os
trabalhos, ao fim se comprometeu em solicitar audiência com o ministro
da Defesa, Celso Amorim, para tratar das reivindicações. Deverá ainda
ser solicitada a presença dos comandantes das três Forças (o general
Enzo Peri, do Exército; almirante Julio Soares de Moura Neto, da
Marinha; e o tenente-brigadeiro do ar Juniti Saito, da Aeronáutica) e de
uma comissão de oito dirigentes de entidades dos militares da reserva e
das famílias dos ativos.
Logo depois da reunião, em entrevista, Paim informou que a presidente da
CDH, senadora Ana Rita (PT-ES), e o senador Lindbergh Farias (PT-RJ)
também se dispõem a acompanhar a audiência. Sobre a audiência pública,
Paim disse que os depoimentos mostraram a existência de uma situação
grave e um clima de insatisfação generalizada.
- É e preciso que se estabeleça um diálogo com eles – disse.
Para o senador, ficou evidenciada a necessidade de um plano de
reestruturação das carreiras militares, para que todos possam “viver com
dignidade”. Os depoentes citaram a situação de oficiais com longos anos
de serviço com ganho mensal que vai pouco além de R$ 3.500. No caso de
um recruta, o soldo – o nome para os ganhos na área militar - fica
abaixo do salário mínimo.
- Quando mostraram contracheques, vimos que os salários deles não dão
para pagar o aluguel de uma simples morada na periferia de Brasília, não
no Plano Piloto – disse Paim.
Causa Qesa
Ficou também decidido que ainda na próxima semana deverá ser encaminhado
aos comandantes das três Forças e ao ministro da Defesa um documento
com a síntese das reivindicações. A lista inclui a chamada Causa Qesa
(Quadro Especial de Sargentos da Aeronáutica), reivindicação para que
seja estendido a esse agrupamento o mesmo nível de ascensão funcional
assegurado aos cabos femininos que, em 1984, foram promovidas à
graduação de terceiro-sargento, com direito a chegar ao nível de
suboficial.
O presidente da Comissão Nacional do Quesa, Eduardo Souza Silva, afirmou
que o quadro feminino conseguiu o acesso direto, de cabo a
terceiro-sargento, por meio de uma mera portaria do então ministro da
Aeronáutica, Délio Jardim de Matos.
- Não existe nenhuma justificativa para que os militares do sexo
masculino não sejam contemplados com o direito à promoção. A portaria é
mais do que discriminatória, é inconstitucional – afirmou.
Outra distorção teria sido provocada pela Lei 12.158, de 2009, que abriu
caminho para que os taifeiros da Aeronáutica – os taifeiros trabalham
na preparação e distribuição de alimentos - ganhassem o direito de serem
promovidos até a graduação de suboficial na reserva remunerada. No
entanto, mesmo ocupando o mesmo patamar hierárquico, os cabos das três
Forças não contam com essa possibilidade de avanço. No máximo, chegam a
terceiro-sargento, levando 20 anos para alcançar essa posição.
Menções a Dilma
O presidente da Associação dos Militares da Reserva, Reformados e
Pensionistas das Forças Armadas (Amarp), Genivaldo da Silva, salientou
que emendas a uma medida provisória que tramita agora no Senado atendem
parte das reivindicações dos militares, inclusive a correção do
salário-família e do auxílio-moradia. Ele apelou para que o presidente
do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), coloque a matéria em pauta e para
que a presidente Dilma Rousseff conserve as mudanças. Por sinal, Dilma
foi mencionada em diversos momentos da audiência, como alvo de pedidos
de atenção e mesmo críticas por suposta indiferença em relação aos
militares.
- Falta consideração com a família militar, com aqueles que defendem a soberania do Brasil – disse Genivaldo.
Para Ivone Luzardo, que preside o Partido Militar Brasileiro, o
argumento de que não há recursos para atender os militares não é
aceitável. Ela lembrou que para outros tipos de gastos o governo não tem
problema para arranjar dinheiro, inclusive, como lembrou, para
construir um porto em Cuba ou para perdoar dívidas de diversos países.
Dito isso, cobrou o pagamento integral e retroativo do reajuste de 28%
ainda pendente.
Esposa e filha de militar, a presidente da Associação da Mulher Amarp,
Miriam Cristina Dienstmann Stein, observou que os militares da ativa não
podem fazer greve nem têm o direito de formar sindicatos. Porém,
destacou que todos votam e precisam “ter voz, não podendo ficar
excluídos da sociedade”.
Ela ressaltou ainda a relevância da missão militar na defesa do país, no
suporte à população em catástrofes e até mesmo na condução de obras do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Apesar disso, observou que
as Forças Armadas não conseguem orçamento para seus investimentos e a
garantia de ganhos justos para seus quadros.
- Por isso, a evasão é muito grande. Bem preparado, o militar vai fazer
concurso e ser aprovado, abrindo mão do sonho de ser militar em prol de
um salário mais digno para manter sua família – disse.
Omissão
Kelma Costa, que preside a União Nacional de Familiares das Forças
Armadas e Auxiliares (Unifax), pediu a todos para que mantenham o lema
“fé na missão”, mesmo estando “esgotados”. Com relação ao reajuste de
28,86%, ele observou que a questão se arrasta por 12 anos e nada se
resolve. Disse que outras reivindicações já podiam estar sendo
negociadas, caso a pauta não estivesse obstruída com antigas questões.
- Infelizmente, a tropa está entregue a um comando omisso, que não se preocupa – afirmou.
Depois de apresentar um contracheque de um terceiro-sargento, no valor
total de R$ 1.461,00, Kelma indagou como é possível sobreviver com soldo
tão reduzido. Queixou-se ainda da ausência de ajuda de custo para
moradia ou de acesso a um programa “Meu barraco, minha vida”. Em
contraste, ela lembrou que os soldados da Policia Militar de Brasília
vão ganhar R$ 7 mil mensais, como resultado da recente mobilização.
Kelma aproveitou ainda para mandar um “recado” a presidente Dilma, a
quem lembrou que a “família militar” é composta de 5,2 milhões de
membros. “Não somos um grupinho que surgiu em qualquer lugar, não”,
reforçou. A seguir, convocou as mulheres das famílias de militares para
que se organizem e lutem.
- Seus maridos não podem, pois está na Constituição, mas vocês podem. A mudança começa nos seus lares.
Médicos cubanos
Acompanhou a audiência o deputado federal Izalcir Luicas (PSDB-DF),
oficial da reserva, que disse que os militares estão de fato "sem
prestigio” no governo. Segundo ele, há “discriminação forte”, bastando
ver os cortes no orçamento e a falta de investimentos estratégicos.
Observou ainda que o governo paga R$ 10 mil a um médico cubano, “sem
nenhum preparo”, um salário acima do previsto para profissional da área
em concurso aberto para o Hospital das Forças Armadas.
Logo em seguida, Paim apelou a todos para que evitassem uma discussão
partidária, observando que isso não ajudaria em nada. Disse ainda que os
problemas nas Forças Armadas são antigos, atravessando diversos
governo, de diferentes partidos.
- Queremos uma política de Estado para as Forças Armadas, e não desse e daquele governo - disse.
O comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, participava no mesmo momento
de audiência na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE),
para debater a aquisição dos novos caças para equipar a Força. Ele, que
havia sido convidado para o debate, junto aos demais comandantes
militares, justificou sua ausência por meio de um recado à CDH e se
colocou à disposição para receber a comissão que está sendo formada para
tentar abrir negociações.
Paim concedeu a palavra a diversos militares da reserva presentes, entre
eles o sargento Antonio da Silva Neto, que se referiu ao quadro de
penúria enfrentado pelos militares e lamentou que chegassem ao ponto de
serem obrigados a tratar publicamente desses fatos, o que chamou de
"expor as vísceras". Para ele, essa é uma situação "completamente na
contramão da coisa certa".
Agência Senado/montedo.com
Cadê o representante da Defesa?
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