'Vai ter muito deputado e prefeito preso no carro da Civil', diz novo secretário
'Vai ter muito deputado e
prefeito preso no carro da Civil'
Instituição, que volta a ter status de Secretaria,
redesenhou sua estrutura para ingressar na nova era da investigação, cuja
premissa básica se resume à expressão 'Siga o dinheiro'
Por RAFAEL
NASCIMENTO E WILSON AQUINO
Delegado Marcus Vinícius Braga - Daniel Castelo Branco / Agência
O Dia
Rio - Os ladrões do dinheiro público, com foro
privilegiado ou não, que costumam se arrepiar quando avistam o camburão preto e
dourado da Polícia Federal, vão passar a ter pesadelos com a viatura preta e
branca da polícia judiciária estadual. "Agora você vai ver muito deputado
e prefeito sendo preso no carro da Polícia Civil", projeta o secretário
Marcus Vinicius Braga. A instituição, que volta a ter status de Secretaria,
redesenhou sua estrutura para ingressar na nova era da investigação, cuja
premissa básica se resume à expressão 'Siga o dinheiro', seja no combate à
corrupção ou ao crime organizado.
Para tanto, Braga está montando um departamento
para descobrir onde e como os criminosos estão escondendo o dinheiro e o
patrimônio obtido com o dinheiro sujo. Nesta entrevista ao DIA, Braga detalha
seus planos. O secretário planeja criar uma delegacia exclusiva para investigar
mortes de policiais, mas diante da escassez de recursos ainda não sabe quando a
ideia vai sair do papel.
O DIA - O que muda na Polícia
Civil?
BRAGA - Além do status, agora somos uma Secretaria,
muda também a estrutura. Antes, tínhamos as subchefias Operacional e
Administrativa, que se transformaram em subsecretarias. Agora, além das duas,
teremos também a subsecretaria de Inteligência. Somos a Central de Inteligência
do estado.
O que significa a Central de
Inteligência do estado?
O Sistema Guardião (programa de computador que
grampeia todo mundo) agora está na Polícia Civil. Podemos produzir inteligência
de um modo geral, menos governamental. Produzir inteligência policial contra o
tráfico, milícia, crime organizado em geral, além da administração pública, no
caso de servidores sem foro privilegiado, colarinho branco e etc. Mas as
principais mudanças acontecem na subsecretaria Operacional.
Quais são?
Teremos um novo departamento que está no plano de
governo. Será o Departamento Geral de Investigação à Corrupção, ao Crime
Organizado e à Lavagem de Dinheiro (DGICCORLD). Ele eleva a Polícia Civil a
outro patamar. Começaremos a atuar em uma esfera que não atuávamos. A Polícia
Civil tem 210 anos e sempre foi muito boa. Só que não era cultura nossa, e nem
do Brasil, você correr atrás do dinheiro dos criminosos. Isso surge a partir da
Operação Lava Jato. Não era cultura. Quando começou a Lava Jato, os criminosos
começaram a se preocupar.
Mas o que muda tanto?
Como era antigamente? A polícia prendia 70 pessoas
e daí acabava a operação. E o dinheiro desses caras, estava e ia para onde?
Então, nunca se fez nada no Rio de Janeiro em relação a isso. Pensei: só
prender não adianta. Vi o plano de governo e achei interessante, já que fala
muito de crime organizado, então precisamos criar um departamento para isso. O
DGICCORLD terá um núcleo de investigação para crimes violentos (tráfico,
milícia, roubos de carro e carga), núcleo de colarinho branco e de
administração pública. Esse núcleo de administração pública é a cereja do bolo:
aqui vamos investigar quem lesa o estado. Na minha posse eu disse:
"ninguém mais vai roubar o estado".
Mas e os políticos?
Na subsecretaria Operacional, além do DGICCORLD,
teremos mais cinco departamentos, e quatro coordenadorias. Uma das novas
coordenadorias será a de Atuação de Atribuição Originária do PGJ. Essa nova
coordenadoria funcionava com um grupo pequeno de trabalho lá na Delegacia
Fazendária. Acabei com isso, elevei para coordenadoria e fiz um convênio com o
procurador-Geral de Justiça (PGJ). Os crimes que o PGJ investiga são em cima de
pessoas que têm foro, como secretários, deputados estaduais, prefeitos e
vereadores. Ou seja, pessoas que a polícia não pode investigar. Se o
departamento de lavagem de dinheiro esbarrar num vereador, babou!
E como vai funcionar esse
processo?
Fizemos um convênio onde a coordenadoria trabalha
lá no MP com eles, são quatro delegados e 14 policiais. Isso permite à Polícia
Civil ser um 'longa manus' do MP na investigação. A investigação é deles e
somos a parte operacional. Agora você vai ver muito deputado e prefeito sendo
preso no carro da Polícia Civil. Antes, não se via isso porque não podia. Isso
é muito importante para a Polícia Civil, nos dá visibilidade e credibilidade. A
gente viu, por exemplo, o Rodrigo Neves (prefeito de Niterói) entrando no carro
da Polícia Civil, preso.
Então teremos menos operações
e mais inteligência?
Não posso dizer isso, porque é concomitante. O que
nós fazíamos, vamos continuar fazendo. Não tem como parar.
O governador Wilson Witzel
orienta a polícia a "mirar na cabecinha e fogo", no caso de suspeitos
de fuzil. Como o senhor interpreta essa expressão?
Eu só olho para o Código Penal, artigo 25, perigo
iminente. Diante do perigo iminente justifica! As palavras do governador
encontram justificativas no Código Penal.
O senhor se identifica com
essa política?
Sim
A polícia pega mais leve com a
milícia do que com os traficantes?
Isso não corresponde à verdade. O nosso histórico é
de pegar pesado com a milícia e vamos pegar mais pesado ainda, com o tráfico
também. A Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (DRACO) fora
da estrutura da polícia era uma aberração jurídica. É uma Delegacia de Polícia.
Nunca deveria ter saído da polícia e nunca mais vai sair. Nós, policiais civis,
não vamos mais permitir isso. Isso é uma brincadeira com a sociedade.
E quanto às mortes de
policiais?
Eu queria fazer uma delegacia exclusiva para
investigar mortes de policiais. A delegacia do policial vítima. Não tive
condições ainda, mas é meu projeto. Ainda está difícil em termos de recursos,
mas é a tendência. Vai funcionar dentro do Departamento de Homicídios. Como não
tenho condições ainda, vou dobrar o efetivo do núcleo, que funciona somente na
capital, e pegar o modelo deste núcleo e estender às delegacias da Baixada e
Niterói. Um policial morto é o estado que morre! Tenho pelo menos 1,5 mil
operações em favelas e em alguns muitos enterros que fui na vida, foi de
policial que tombou ao meu lado. É muito triste.
A taxa de elucidação de
homicídio na capital é a menor, segundo o ISP.
Não tive acesso ao estudo e a gente tem que ter um
cuidado danado. O crime de homicídio prescreve em 20 anos. Como posso dizer que
não elucidei um crime de 2010, cuja investigação ainda está em andamento? Que
estatística é essa? Não posso confiar e nem comentar esse estudo, porque ainda
não entendi o que ele quer e como foi feito. Quem fez o estudo levou essa
variante em consideração?
A Divisão de Homicídios virou
um departamento?
Qual é o nosso bem mais importante? É a vida. Acho
que esse departamento será de grande valia para a sociedade. O Departamento
Geral de Homicídios e Proteção à Pessoa (DGHPP).
Mas qual a diferença?
Primeiro, o grau de subordinação e hierarquia vai
responder diretamente à subsecretaria operacional. Segundo, é que a proteção à
pessoa envolve muitas coisas. Para começar vamos trazer a DDPA (Delegacia de
Descoberta de Paradeiros) para o DGHPP. Existe uma diferença grande entre os
desaparecidos do Centro do Rio e os da Baixada. Para o futuro, criaremos uma
DDPA na Baixada e duas DHs no Norte e Sul Fluminense (Macaé e Volta Redonda).
Para tudo isso precisamos de estrutura e a lei de responsabilidade fiscal
impede muita coisa, inclusive contratação de mais servidores. Começamos o trabalho
e vai depender muito das negociações do estado. Mas estamos começando,
inclusive vendo os prédios onde as delegacias ficarão.
O governador manifestou a
intenção de tornar a Polícia Civil um órgão independente, para evitar,
principalmente, intromissões políticas. O senhor pediu isso a ele?
O primeiro passo de independência foi dado quando o
governador criou a Secretaria. O que ele quis dizer foi referente à atividade
específica do delegado de polícia. Promotor, juiz e defensor público têm
garantias como irredutibilidade e inamovibilidade. Eles têm isso através de
lei, o governador está propondo uma lei orgânica da Polícia Civil para que os
delegados tenham as mesmas garantias. É o governador que tem mais respeito
pelas polícias. E todos nós estamos muito satisfeitos. É impressionante a
deferência dele com as forças policiais.
E o caso Marielle?
Somente o delegado Antônio Ricardo (diretor da
DGHPP) está autorizado a falar sobre essa investigação.
Mas houve certa frustração da
gestão passada por não levar os mandantes e assassinos para a prisão. Para o
senhor é questão de honra?
O que posso dizer é que estou muito otimista. Já vi
a investigação e confio plenamente no Antonio Ricardo e no Giniton (Lages,
delegado que investiga o caso). Não posso falar mais nada.
O governador recebeu crítica
de tudo quanto é lado ao extinguir a Secretaria de Segurança. Qual a sua
opinião?
Eu acho a atitude dele exemplar. Os convênios
federais são assinados com a Secretaria, não é? E vão continuar.
O senhor é um policial
operacional e agora vira um burocrata. Sonhava em ser secretário?
Esperei 18 anos (para ser secretário). E isso é uma
vitória para mim e a mudança de chefia de Polícia Civil para Secretaria é uma
conquista para a sociedade. Na verdade, eu sempre gostei desses dois viés. E só
sei falar de burocracia porque fui da rua. Eu chego cedo (na Secretaria) e vou
em todos os setores. Fui criado na guerra do dia a dia. A pessoa que é criada
na guerra e no sangue não tem tempo de errar, porque se não, morre. Então, não
tenho tempo para falhar. E quero usar isso na parte administrativa. Não teremos
tempo para errar. Será pela manhã, tarde e noite tentando acertar. Afinal, nos
foi confiado a volta de uma Secretaria.
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